segunda-feira, 26 de novembro de 2007

Blues

Tem uma mão espremendo o meu coração, fazendo lágrimas aparecerem nos olhos e um nó na garganta. É uma vontade de chorar sem motivo que me faz sentir saudades, e não o contrário, como é de costume. Bem, pelo menos eu acho que o normal é você sentir saudades e por isso ter vontade de chorar. Mas comigo não: primeiro veio a vontade de chorar, depois chegaram as saudades. Abro uma garrafa de vinho tinto suave e me sirvo de uma taça. Ligo o som, escolho um cd de blues, ponho pra tocar não muito alto. Apago as luzes e acendo umas velas. É madrugada, a cidade inteira dorme. Tudo o que vem lá de fora é silêncio e escuridão, combina bem com o meu estado de espírito. Sento-me em uma cadeira reclinada, absorvendo a música e sorvendo o vinho. Deixo-me levar pela melodia e pela melancolia, sentindo o coração cada vez mais espremido, nodando a garganta e alagando os olhos. Minha cabeça flutua. A tristeza pura é leve, vazia. Não é um bom momento para racionalizar, mas mesmo assim tento identificar minhas emoções. Há saudade, um toque de amargura, um bocado de frustração e a tristeza sem motivo. Começou com um sonho do qual não me lembro: o sonho se foi, mas a sensação ficou. Sensação de impotência, de falta, de blues. A tal da saudade. A solidão da madrugada enaltecida pelo vinho, brilhando pela escuridão. Desisto de resistir e fecho os olhos. Deixo a canção penetrar pelos poros e as lágrimas saírem sem controle. Choro como uma criança assustada, sozinha e indefesa. O tempo passa sem que eu perceba, abro os olhos. Uma das velas se apagou. Levanto da cadeira, paro a música, apago as outras velas. A vontade de chorar passou, mas a tristeza indefinida continua aqui. Deito-me na cama, abraçando um travesseiro, abraçada pela saudade. Fecho os olhos, os blues ainda tocam dentro de mim. Deixo os pensamentos flutuarem até o mundo dos sonhos. Talvez tudo mude com a manhã.
Só me resta a esperança.

domingo, 18 de novembro de 2007

Solidão

Passo dias olhando pro teto
de estrelas de plástico
que eu mesma pendurei.
Lá fora, passam as nuvens,
passa o sol,
passa a chuva,
passa a lua,
até as estrelas de verdade...
Lá fora tem gente gritando,
carros correndo
e buzinas tocando.

Aqui dentro, toca Jazz e Blues.
Um saxofone chora,
um piano vibra,
corações dançam
e espíritos flutuam...
Eu apenas ouço
e deixo o espírito se levar
em um mar de emoções alheias,
que encharcam as minhas próprias,
sem conseguir me lavar.

Leio palavras que nunca foram minhas,
nem para mim foram escritas,
mas não importa,
eu as tomo,
passam a ser minhas
assim que tocam os olhos
e se inscrevem na alma.

Palavras
que não formam o mundo
nem sobreviveriam à realidade,
mas estão salvas aqui,
dentro dos livros,
dentro de mim.

Coleciono imagens que nunca vi
numa galeria imaginária,
com outras que até vivi,
ou quase,
repintadas com as cores da memória.
Lembro de gente que inventei,
reinvento gente que conheci,
conheço gente de que nem me lembro...

Tudo acontece sob esse teto que me olha
com suas estrelas fluorescentes,
essa música que me ouve
sem piano e saxofone,
essas palavras que me lêem
sem mentiras e sem verdades,
e essas imagens que me pintam
com cores que nem existem...


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Não abandonei o blog, mas acho que estou em um hiato criativo. O que é quase estranho, considerando a introspecção que me tomou nessas últimas semanas... Estou atolada em coisas pra fazer (como sempre, aliás) e só passei aqui para mostrar que ainda vivo. O texto talvez não faça muito sentido, escrevi agora em, sei lá, cinco ou dez minutos (o tempo passa em um ritmo estranho no meu mundo). Não pensei muito sobre ele, não escolhi muito as palavras. Está tão desleixado e avoado quanto eu tenho estado. Talvez outro dia eu tente melhorá-lo. Eu tinha feito um acordo comigo mesma de não dar explicações e nem escrever a esmo quando comecei o blog neste endereço, mas não dá pra evitar. Tudo o que tenho escrito recentemente são conversas informais com o papel e, tendo em vista o "hiato criativo", o acordo meio que foi para o espaço. Mas por enquanto chega.
Tchau.

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Ressaca

     E lá estava ela, caminhando trôpega de volta para casa. Podia ser culpa do sapato alto na rua sem asfalto, ou até mesmo da fome que começava a devorar as paredes do estômago, mas o fato é que ela andava bêbada sem ter ingerido uma gota de álcool sequer. No caminho, pensamentos desvairados, desconexos, diálogos imaginários descuidados, preocupações do dia que se passou e dos que ainda estavam por vir. Nunca mais passaria um dia inteiro em jejum, ela jurava para si mesma, como já havia feito centenas de outras vezes, sem nunca cumprir. Ele iria passar em sua casa esta noite, para enfim colocar os pingos nos is, ele prometeu. Verdade que não era a primeira vez que prometia isso. Assim como ela, ele também tinha uma sacola cheia de promessas não cumpridas. Mas desta vez ela acreditava que seria diferente. Antes de sair do trabalho, ela passou no supermercado e fez compras para um jantar a dois, onde, enfim, os is ganhariam pingos. Talvez viesse daí a sensação de ressaca. Sua rua parecia mais longa do que nunca, e seus passos, mais tortos. Sua vida inteira parecia torta, bêbada. A vida bêbada de uma pessoa sóbria. Talvez um pouco de álcool curasse tudo. Não dizem que o melhor remédio para ressaca é mais um gole? Ou um copo inteiro? Além do que, o álcool desinfeta, e ela precisava disso: desinfetante para a alma. Uma vida na ressaca por não ser vivida, culpa dos malditos is sem pingos.

     Um cigarro. Talvez um cigarro ajudasse. Dizem que cigarro combate a ansiedade. Um barzinho, “um maço de cigarros, por favor” “Qual?” Qual? Já decidira comprar cigarros, agora ainda tinha que escolher um? Pediu um Marlboro, automaticamente. Era o cigarro que ele fumava e ele raramente ficava ansioso. Devia funcionar. Seguiu seu caminho torto, com passos tortos, até enfim chegar em casa. Abriu a porta, entrou, acendeu as luzes. Olhou para a sala vazia com estranhamento. Não parecia a mesma sala que deixara de manhã. Foi até a cozinha largar as compras. Cozinha vazia, limpa e arrumada. Seguiu para o quarto, onde deixou a bolsa. As coisas nunca ficavam tão arrumadas com ele em casa. E ela gostava da casa arrumada. Mas temia a casa vazia. O silêncio a aterrorizava, ligou o rádio. Sentiu novamente a tal da ressaca, lembrou-se dos cigarros. Foi até a cozinha em busca de fósforos. Pegou a caixinha cheia dentro do armário, tirou um palito e o riscou. Lembrou-se de como ele riscava o fósforo ao contrário, e de quantos isqueiros ela deu a ele, que perdeu. Nossa, foram tantos… “Ai!” Voltou do passado com a chama quente perto do dedo. Apagou o fósforo num reflexo. Pegou o maço de cigarros, abriu e puxou um, esforçando-se para não reacender mais lembranças. Acendeu o cigarro, catou um cinzeiro – lembrança dele – e sentou-se. A última vez que fumara na vida foi no início da faculdade. Nossa, há quanto tempo… Tragou o cigarro, sentiu a fumaça entrando em seus pulmões e lembrou-se das amigas do colégio e de seu primeiro cigarro. Soltou a fumaça e ficou quase orgulhosa ao constatar que depois de vários anos sem fumar, não engasgara. Sentiu um alívio imediato. Tanto tempo sem um cigarro e esta continuava sendo uma prática válvula de escape. Continuou sentada, divagando, enquanto a brasa consumia o cigarro e as lembranças consumiam sua alma.

     Pouco antes de chegar no filtro, apagou o cigarro. A fome voltou a devorar as paredes do estômago. Sentiu dor de cabeça e tontura, achou melhor fazer a janta, ele chegaria a qualquer momento. Preparou a comida com cuidado e dedicação. Sabia que o tempero estava perfeito, do jeitinho que ele gostava. O tempo passava e nada da campainha tocar. A fome gritava. Decidiu comer logo, esquentaria tudo quando ele chegasse, e até comeria um pouquinho novamente, só para acompanhá-lo. A dor de cabeça passou, mas o sentimento de ressaca continuava. Já estava ficando tarde, onde ele estava? Os is precisavam dos pingos, estavam irriquietos como crianças sem pais. Sentou-se para esperar. “Será que aconteceu alguma coisa? Por que ele não telefona? Também não vou ligar, é melhor”. O tempo passava, implacável. Ela, escorregando pelo sofá, tentando manter-se atenta, perdeu a briga para o cansaço e caiu no sono.

     Acordou com o sol invadindo a sala e acariciando seu rosto. Já era quase hora de ir para o trabalho. Mais uma espera em vão. Mais uma promessa violada, de um amor que tanto prometeu e nunca cumpriu. Levantou-se e foi para o banho, arrumar-se para mais um dia de ressaca.

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

sonhos

Sonhei que dormia,
o dia se esvaia em uma tarde cinza de céu nublado.
Revoltas, as águas do mar batiam na areia me pedindo pra acordar.
Mas não atendi,
continuei a dormir, sonhando.

Sonhei que sonhava,
o dia amanhecendo em uma bela manhã de céu ensolarado.
Nas águas calmas do mar, eu velejava
rumo ao desconhecido distante, uma nova aventura...
até que então, acordava.

Sonhei que acordava,
uma noite morna e estrelada, o amor ao meu lado,
sem mar, sem areia, sem barco,
mas quem precisa dessas coisas?

Acordei.

o quarto escuro e frio,
o mortal silêncio da madrugada.
Pela janela, contemplando a lua cheia e prateada,
já não me sabia mais
se dormindo
ou sonhando
ou acordada…
Querendo viver meus sonhos e realidades,
mesmo que paralelas,
mas infinitas em possibilidades…

(06/07/2002)

terça-feira, 16 de outubro de 2007

Distante

A distância diz tanto!
tudo é dito e desdito,
então edito, dia-a-dia,
um breve acalanto

nessa melodia melancólica
de sincero desencanto,
prezo o instante – preso, insistente –
em que ansiosamente, mas sem espanto,
assisto às suas asas (assaz em vão)
alçando longos vôos de déu em déu...
enquanto me espalho em pranto,
devaneios e desatinos e desisto:
já nem te quero tanto!

sábado, 13 de outubro de 2007

Ah!

Ah, a vida!

Este joguinho de gato-e-rato
que dá tanto gosto
quanto desgosto de se brincar,
que nos deixa felizes, arrasados,
lavados, amarrotados,
e até passados,
tudo de uma vez...

que nos traz lágrimas atrás de sorrisos,
atrás de esperanças, atrás de desesperos,
atrás de recomeços, atrás de inconclusões...

uma seqüência aleatória
de escolhas erradas,
mal-entendidos,
desentendidos
e parcos entendimentos.

Vidinha de medos,
inseguranças,
incertezas,
absolutas ou parciais,
raramente imparciais.

ela, que é madrinha sem ser fada,
que amarga ao adoçar,
às vezes erra na mão
e azeda,
mas recicla.

Ah, a vida...
seja em verso ou prosa,
romance, drama ou terror,
forró, MPB, rock ou funk...
seja tudo e ao mesmo tempo,
ou nada e nunca...

Quem me dera viver um sonho a cada dez vidas que sonho!

domingo, 7 de outubro de 2007

Purgatório

A madrugada estava triste como sua alma. A vida lhe parecia um erro. Tanto já havia chorado, gritado e se desesperado que mal lhe restavam forças para respirar. Tudo que havia feito, deixado de fazer, dito e ouvido fazia a cabeça girar. A última discussão ecoava ininterruptamente em seus pensamentos. Cada insulto e agressão parecia cortar a pele, um súbito sentimento de culpa sufocando o coração. Tirou toda a roupa, despindo-se de seus problemas, um a um, peça por peça. Ligou o chuveiro e deixou a água gelada cair sobre a cabeça. Sentiu o choque térmico e tremeu, mas não recuou. Esvaziou a mente. Parou de pensar para simplesmente sentir cada gota que molhava seu corpo. Ensaboou-se delicada e milimetricamente, como se aquele fosse o último e o primeiro momento de sua vida. Viu descer pelo ralo toda a sujeira, dor, culpa e tristeza que antes carregava. Assim foi seu purgatório. Saiu do banho purificada e, vendo os primeiros raios de sol iluminarem e aquecerem a cidade, teve a certeza absoluta de que tudo ficaria bem. Tinha que ficar.

terça-feira, 2 de outubro de 2007

Des-

percorro descaminhos,
desconstruo idéias,
conforto-me no desconsolo.

desfaleço procurando,
desencontro-me.
uma vida desfeita em certezas.

descabelada,
desavisada,
desmotivada.

desfocadas, minhas lentes
mostram apenas o deserto.

destôo da palheta de cores,
não faço por desmerecer.
sou um amontoado de ilusões
desmontadas

desperto meu cinismo,
despeço-me do romantismo...
(despreocupe-se, después ele volta.
não há desalmado capaz
de desterra-lo para sempre!)

destemida, caço tigres,
desarmo bombas,
desvendo mistérios
e vendo tudo por aí,
despercebida...

aí eu me desminto:
minha vida é metafórica.
e desaforada.

sábado, 29 de setembro de 2007

Breves Conceitos

Saudade é quando
a gente sente tanto
a presença da ausência
que chega a ficar
com gosto de sal
na boca.

...:...

Paciência
é a ciência
de andar
com passos
de bebê

...:...

Esperança
é quando
a espera dança
ao som de Elis,
de longo azul celeste,
feito criança

terça-feira, 25 de setembro de 2007

Implicância

Pego linha e agulha
pra me costurar em você...

Você já chega com a tesoura!

Perco então o fio da meada
e me enrolo.
Peço ajuda à desatadora de nós,
nossa senhora,
que me ensine a desatar-nos!

Começo a tecer uma colcha
de momentos.
Espalho as lembranças,
entrelaço-as cuidadosamente...
Depois de muito trabalho,
estendo a colcha no chão
pra você passar.

Mas você voa e nem vê!

Desisto,
não quero mais saber!
Dobro nosso memorial
com desvelo revoltado
e o acomodo em um baú,
que tranco a cadeado.
A chave, jogo fora...

E você a pega no ar!

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Assim

Se eu não sou exatamente
o que você queria,
paciência!

Você também não é
quem eu imaginava
e o quero, mesmo assim,
assim mesmo.

se você for
exatamente como imagino
igualzinho aos meus sonhos
eu vou embora
detesto desmancha-prazeres

(Martha Medeiros)

sábado, 15 de setembro de 2007

flor da pele

Pouso a mão sobre seu rosto,
quase sem tocá-lo.
Os dedos tremem, aflitos,
mapeando cada detalhe,
estampando em mim
a textura da sua pele

Meus sentidos se afloram
sentindo os seus,
Vagando nos versos derramados
pelo compasso da sua respiração

Enquanto dorme indefeso,
despetalo-me em alegrias,
maravilhada.
Como um bebê que ainda
não aprendeu a sentir medo.

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Tautologia

Meu corpo inteiro
sorri
ao vê-lo

Palavras se abraçam
ao pensar
em você

Sou repetitiva,
quase obcecada
Da boca pra dentro,
só falo em você

Faço versos sem rimas
que nunca tocarão
seus olhos

Tudo o que calo é da boca pra fora.

sábado, 8 de setembro de 2007

Endless

Faço muitos planos
que descem pelo ralo
e se perdem no esgoto

Então improviso

Tenho uns surtos
de inspiração,
outros,
psicóticos

com dedos sapateando o teclado,
escrevo coisas sem nexo
tento (em vão) fazer poesia do cotidiano
e viver as palavras que brotam de mim

...

e agora, o que dizer?
como termino?
Sei lá!
Eu mesma sou sem fim...

quinta-feira, 30 de agosto de 2007

Tarja Preta

Às vezes eu tenho certeza de que, se eu conseguisse acabar com meus amigos imaginários, ia descobrir que um dos dois não existe: o mundo ou eu.

domingo, 26 de agosto de 2007

Madrugada

Ausência
de corpo presente
e copo vazio
Vazando

Deixo-me ir

Calo o silêncio
com sons
que consolam
o amanhecer

sábado, 18 de agosto de 2007

Abrigo

Uma dança,
um descuido,
mero acaso.
CD do Chico,
passos suaves,
um abraço.

Momentos assim são leves,
como penas
suspensas no ar
por um sopro,
um suspiro breve...

De repente
um beijo calado,
colado,
que se repete
entre vãos,
cheio de mãos...

Como a brisa
varre as folhas secas
no outono,
eu te sigo,
passo a passo,
passando a limpo
um desejo desvairado

No fim, peço apenas
que leve consigo
meu riso rasgado;
que eu trago comigo
seus olhos
em meus sonhos
mais ousados.

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

sábado, 11 de agosto de 2007

Partitura

Eu dei a partida
Ou será que foi você?
Não importa,
eu invento,
fui eu.

Caixinha por caixinha,
construí um monumento,
uma ode à surpresa,
ao acaso e ao momento.

Tive que ir,
sem querer,
insegura,
segurando sonhos
e juras.

Quando voltei
você me partiu.
Num verso, fiquei.
Revoltada,
parti.

Mas aí...

O vento sopra uma palavra
danadinha e safada,
que chega cabriolante,
repousa sobre meus ombros,
toma fôlego... e salta!
Uma vez,
duas, três,
até alcançar os ouvidos:
es pe ran ça.

(Esperança é quando
a espera dança
ao som de Elis,
de longo azul celeste,
feito criança)

Com copo de whisky na mão
e um band-aid no calcanhar,
alego insanidade
(em tão tenra idade!)
e revolto ao encanto,
frente e verso,
no meu canto de reverso.

quinta-feira, 9 de agosto de 2007

amarelo-memória

As malas, você levou...
Mas as lembranças ficaram,
no exato lugar onde você
esparramou.

Não passou de um mal-entendido,
hoje sei
Tudo foi uma invenção minha,
desta memória sublime,
deste jogo de me encontrar.

Sabe,
tem gente que vai ao analista,
psicólogo, psiquiatra ou
ao programa da Márcia

Não eu

Eu escrevo

mentiras, ficção
às vezes, até verdades,
por que não?
É sempre sobre mim

Estou convencida:
(muito convencida)
se o mundo não gira ao meu redor,
é porque errou a rota.

Então, não se iluda, tolinho.
Quando escrevo sobre você,
é de mim que estou falando.
E se você não está nem aí,
nem aqui,
nem preciso dizer quem se enganou.

Não adianta voltar,
refazer as malas e implorar...
Aquelas lembranças que você trocou
por um sofá,
não passam de fotos amareladas,
linhas maltraçadas,
e palavras até bem intencionadas...
mas cinzas
de uma chama
que não chama mais ninguém...

terça-feira, 7 de agosto de 2007

Renúncia

você ainda dorme
.................tranquilo
sob meu olhar de chuva
..............................atento
tatuo na veia seus detalhes
(não posso perder para
armadilhas da memória)
para depois recompor
traço a linha
sua poesia

vou-me
(de vez)
((desta vez))
(((de uma vez)))

mas antes
beijo de leve sua boca
(que levo)
sussurro uma jura
em seu sonho

Deixo uma lágrima na saída
......
Adeus

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Mentiras sinceras me interessam...

Não quero saber onde foi que errei,
nem como,
nem por que
Não quero críticas severas
sinceras
construtivas?!
Esqueça!
Eu quero é ser mimada!

sábado, 28 de julho de 2007

Insônia

Mais uma noite
não sei se vou agüentar
Estou cansada,
não tenho sono,
o tempo custa a passar

Faz muito frio
deito com sua ausência,
abraço o travesseiro,
vejo você,
em meio ao silêncio,

meu pulsar frenético
se confunde com uma canção de ninar
sussurrada por sua voz monocórdica
que me embala os sentidos

a distância transforma o passado
em reticências...
mas a vontade o aviva
com cores de Andy Wahrol
vontade de rever
reviver
voltar
revirar
revoltar

a saudade me aquece
no que a memória falha,
o corpo não esquece
velejando entre sonho e lembrança,
sinto sua barba macia,
suas mãos lenientes,
seu cheiro de sabonete barato

você está em seu lugar,
ao meu lado, a minha volta,
envolto
em meus braços

Sem aviso, as luzes da manhã
invadem o quarto
me despertam de um estado hipnótico
e roubam você de mim
tento ignorar,
me concentro,
não quero que você vá
(ainda não...)
só mais um pouco...

mas a luz é mais forte
que a minha escuridão

Mais uma vez o tempo me ultrapassa
me ultraja
e vence

olho ao redor,
procuro por você
não há ninguém além do silêncio

(agora tenho que enfrentar mais um dia,
e mais uma noite,
e não sei se vou agüentar...)

quarta-feira, 25 de julho de 2007

sôdade

Parece que foi há
semanas,
séculos,
milênios...

E foi.

Foi todo esse tempo
e mais um pouco,
todo esse tempo
e um pouco mais.

Todo o tempo do mundo
nunca é suficiente.
e "nunca",
nem é tanto tempo assim.

Não é exagero
É saudade.

segunda-feira, 23 de julho de 2007

quem tem fome tem pressa

tenho fome de tudo
e tenho pressa
quero tudo pra ontem
e do meu jeito

se o que eu busco
não existe
não desisto
eu invento

com unhas e dentes
eu devoro
sem decoro
indecente

sábado, 21 de julho de 2007

chuva


“O coração é um músculo muito elástico”
Woody Allen,
em Hannah e Suas Irmãs

Começou um temporal enquanto voltava para casa.

Lembrei-me outro como este, quando você me deixou
e eu saí andando sem rumo madrugada adentro,
desejando que aquela água lavasse a alma
e levasse embora as lágrimas.
Só mesmo o barulho da chuva chicoteando o chão
pra abafar gritos de tristeza, raiva e incompreensão.
Cheguei a desejar uma pneumonia arrebatadora,
para culpá-lo ou pelo menos justificar tanta tristeza
(talvez a dor física pudesse superar as dores do coração).

Há tempos não pensava em você
(que fez temporal em minha vida)...

Cheguei em casa encharcada
lembrado de outro tempo,
quando te acompanhei a um lugar estranho,
cercada por gente estranha,
apenas seguindo o teu sorriso.
Sozinha
perdida
iludida.


Hoje,
o som da chuva no telhado a fazia parecer mais forte do que era
(o diabo nunca é tão ruim quanto o pintam).
Já quase seca, um impulso leva-me de volta à chuva,
na varanda
As gotas tocam meu rosto,
como o céu devondo as lágrimas derramadas;
uma remição tardia.
De repente, um sorriso,
que vira risada
e explode em gargalhada.

Quem está na chuva é para se molhar.
Mas depois a gente se seca.
Eu me sequei.

sexta-feira, 20 de julho de 2007

Head Over Feet

Não se espante se eu me apaixonar por você
Eu sou assim: me apego fácil
E me encanto, e me iludo, e me apaixono...

Não se espante se for logo por você
e seus cabelos despenteados,
e seus tênis remendados,
e suas desculpas esfarrapadas...

Acontece que, entre trancos e barrancos
e remendos e farrapos...
eu me encontro
e me encanto...

Mas não se espante,
ouvi dizer que é assim mesmo:
O amor despenteia
(como em propaganda de shampoo)

quinta-feira, 19 de julho de 2007

É

É, só pode ser amor, acho que você tem razão. Fico mais feliz ao seu lado. Sou mais eu quando estou com você. Já em sua ausência, sou toda você. Tá certo, você já sabia: só podia ser amor. Mas como foi que eu cheguei à conclusão sozinha? Logo eu que não acreditava em amor? Foi difícil, eu lhe garanto. O processo de aceitação mais lento e gradual pelo qual já passei. Começou com afeição, virou encantamento, seduziu-se com a cumplicidade, confundiu-se com amizade. No meio da fase da acomodação, espantou-se com vontade, necessidade, ciúmes e brutais saudades. Por fim veio à luz. Amor, só pode ser amor... Afeiçãozinha safada aquela, não? E agora, que nós dois sabemos disso, é melhor pararmos de perder tempo, não acha? Então, vamos correndo para o centro da Terra, onde o calor intenso vai conservar nossa chama?

quarta-feira, 18 de julho de 2007

ego

hoje estou cansada
quero 24h de férias
e quero você pra mim,
só para mim
em cada segundo,
quero ser primeira

portanto, desligue o celular,
o orkut, o msn, o canal telepático
tranque o mundo la fora, isole-o
não quero saber de jornal, tv, política,
futebol, religião, economia, vida alheia...
nada que não diga respeito a mim
nada disso interessa

quero atenção exclusiva,
silêncio, carinho, compreensão
quero ser a única no mundo,
no nosso

egocêntrica, egoísta (e ciumenta)
megalomaníaca com poucos recursos
embarque na minha egotrip
só por hoje, fique tranquilo
amanhã tudo volta ao anormal

terça-feira, 17 de julho de 2007

reerrar

"give me reason, but don't give me choice
cause I will just make the same mistakes again"
(James Blunt)

Parece que tudo o que passou
ainda nem aconteceu
Minha vida roda ao contrário
Giro em torno do meu próprio mundo,
à deriva no universo...

Eu sou o que vem antes do passado,
a memória de um peixe.
Vivo de recomeços,
sempre há um novo erro a se cometer.

E os nossos inícios são sempre inéditos
- novos erros, eu diria -
novos inícios pro que nunca teve fim.



(dez. 2005)

segunda-feira, 16 de julho de 2007

Soraya

(Para o Bruno)

A primeira vez que parei o mundo foi quando conheci Soraya.

Estava em um congresso, e até então só tinha visto uma foto dela. Foi um amigo em comum que me mostrou a foto, e prometeu que éramos feitos um para o outro. Eu, que estava soltinho e já em liquidação total, acreditei e me apaixonei quase que instantaneamente. Contei os dias até o congresso, quando finalmente conheceria Soraya. Sabia que ela estaria lá, pois ela participava da organização, mas o amigo não pôde ir para nos apresentar. Cansado de esperar por uma intervenção divina, decidi dar uma mãozinha ao destino. Passei horas vasculhando os rostos de todas as moças presentes em busca da figura que vira na foto. Nada. Inconformado, decidi recorrer à mesa de informações. Fui até uma moça com uma prancheta na mão e perguntei por Soraya Campos. A moça, muito solícita, apontou-a para mim. É aquela ali, ó!. Aquela onde? Aquela, bem na frente. Olhei, olhei e não acreditei. Ali, ó, não tá vendo? Aquela de blusa branca e saia jeans.

Foi nesse momento que o mundo parou. Parou por alguns minutos, horas, dias, não sei dizer. O mundo parou no exato tempo de duração da frase "Aquela, de blusa branca e saia jeans". Pode parecer coisa pouca pra você, que não estava lá. Mas "aquela, de blusa branca e saia jeans", é uma frase emblemática na minha vida, que ecoou por todo o mundo durante o tempo em que ele parou. Repetiu-se inúmeras vezes, e eu a ouço até hoje. Em câmera lenta.

"A q u e l a , d e b l u s a b r a n c a e s a i a j e a n s . . ."

Eu tentei fechar os olhos, tapar os ouvidos, abrir um buraco no centro da Terra e me enfiar lá, mas antes que pudesse decidir o que fazer, o mundo voltou a girar.

Bem na minha frente, estavam umas vinte mulheres. Dezenove de preto. Uma de saia jeans e blusa branca. Duas eram lindas, cinco eram bonitinhas e outras doze eram normais. Uma estava de blusa branca e saia jeans.

Ainda a vejo em meus pesadelos.
Sempre de saia jeans e blusa branca.
Acho que aquele "amigo" não gostava muito de mim.

"Eu queria ter um lança-chamas
Eu queria ter uma fogueira
Eu queria ter somente um fósforo
Eu queria ter uma vela acessa
Pra queimar Soraia
Pra ver torrar seu couro
Pra deixar somente o osso exposto ao sol
E depois da meia-noite
Soraia vai voltar
Ela vem toda queimada
Se vingar, se vingar
Eu quero ver
Soraia Queimada
Soraia Queimada
Porque Soraia me queimou
Eu queria ácido sulfúrico
E um litro de alcóol tubarão
Eu queria uma tocha iluminada
Pra deixar Soraia igual carvão
E depois da meia-noite
Soraia vai voltar
Ela vem toda queimada
Se vingar, pode vir! ,se vingar.
Eu quero ver
Soraia Queimada
Soraia Queimada
Porque Soraia me queimou
E doeu..."

(Soraia Queimada, do Zeu Britto)

sexta-feira, 13 de julho de 2007

filosofia da mente para o coração

O que a gente sente devia ser o bastante
o que a gente sabe, sem explicação
Mas estamos sempre em busca de conceitos,
lógica, definições, porquês, razão
Pra quê tudo isso?

Sentir é mais difícil do que explicar
não se aprende em livros
Motivos são fáceis de inventar:
basta um pouco de imaginação,
bom senso e boa vontade

Sentidos
Sentir
sem sentido


Qualia
conhecimento em primeira mão
o inefável,
o indelével,
o inexplicável,
certeza na primeira pessoa

Eu gosto de você assim,
de graça
Não é porque você gosta do Chico,
do Almodóvar ou do Quintana
Nem porque sua cor favorita é lilás,
ou porque também quer ir pra Londres,
e fazer o sol nascer toda manhã

Não é pelo seu senso de humor
negro,
nem por sua alma
furta-cor
Nem por tudo que você diz saber,
nem pelo que não entende sobre
amor

Foi por tudo isso que eu fiquei,
mas nada disso me trouxe aqui.

Gosto desde antes,
talvez, de sempre.
Não preciso de A+B
Para provar o que sinto

Pode ser intuição,
pode ser instinto
(de sobrevivência ou destruição)
Tanto faz.

A rosa ainda seria uma rosa,
mesmo que se chamasse
Garibaldo.

Eu não seria mais eu
se não tivesse você
ao meu lado.

_____________________________

Qualia [singular: quale, em latim e português]. Termo filosófico que define as qualidades subjectivas das experiências mentais. Por exemplo, a vermelhidão do vermelho, ou o doloroso da dor. (tem mais aqui)

quinta-feira, 12 de julho de 2007

romantismo de uma cética

Rio de Janeiro, 3 de novembro de 2002.
Querido espelho (já explico),

Havia uma tormenta em minha mente, então decidi escrever para me aliviar um pouco das idéias que me perseguiam. Como você bem sabe, acredito que as idéias e os pensamentos só tomam forma e podem ser melhor analisados ao ganhar o mundo. Por isso, trago-lhe meus pensamentos, para que você me ajude a analisá-los e desvendá-los. Ninguém melhor do que você para ajudar-me nessa árdua tarefa…

Então… depois desse primeiro parágrafo explicando o porquê de tão inusitada carta, posso, enfim, ir ao assunto que nos trouxe aqui: eu pensava em você. Ou melhor, em mim. Ou, mais exatamente, no amor. Calma que tudo é justificável.

Antes de lhe conhecer, não acreditava no amor. E talvez ainda não acredite. Bem, certamente não acredito no amor da forma em que ele é exposto na mídia. Não acredito na impossibilidade de uma pessoa viver sem a outra. Mas acredito sim que uma pessoa não queira viver sem a outra. Esse é o meu caso. Pelo menos por enquanto (Não acredito no perpétuo, mas adoraria que você me provasse errada).

Drummond escreveu: “o que pode uma criatura senão, entre outras criaturas, amar?”. Agora começo a entendê-lo. E começo a entendê-lo não porque amo (pois nem sei se amo), mas porque fiquei pensando nos mecanismos dos quais o coração se utiliza para escolher a quem amar. Renato Russo cantou “Quem um dia irá dizer que existe razão nas coisas feitas pelo coração? E quem irá dizer que não existe razão?”. Com todo o respeito, não acredito na aleatoriedade do coração. Acho que, se gostamos, gostamos por um motivo, e se amamos, amamos por um motivo ainda melhor.

Prometo que esta será minha última citação, e, como não poderia deixar de ser, de um dos nossos poetas favoritos, Mário Quintana. “O amor é um beijo no espelho…”. Essa pequena frase norteou todo o meu pensamento. Escolhemos para amar àquele que mais se parece conosco: amamos quem tem em si o que gostamos em nós, ou o que gostaríamos de ter. Amar é enxergar-se no outro. Você é assim. É o que eu sou e o que eu gostaria de ser. É meu espelho.
Sei que havia prometido, mas outra (e agora sim última) citação se faz necessária… (nada como subverter minhas próprias regras) “Amar é admirar com o coração. Admirar é amar com o cérebro” (Theophile Gautier).

Perdoe-me se não pareço tão romântica, se a minha visão de amor é um tanto narcisista e egoísta, mas cada um é romântico a seu jeito. Eu sou ao meu. Talvez ao nosso.

Com amor e admiração,
LM

quarta-feira, 11 de julho de 2007

lembrança que brilha na mente eterna

sou cheia de incertezas absolutas
e de mistérios transparentes

acompanhada por uma ausência incômoda
presente no passado
e
imperfeita no futuro

presa em repetições da memória falha
esqueço das mágoas
e me surpreendo várias vezes com a mesma coisa
prevendo lembranças que brilhem
eternamente
e que nunca mintam

persisto, insisto
desisto

um dia a gente aprende

e eu acerto

terça-feira, 10 de julho de 2007

breves

..::..

Desperto
Disparo
De perto
Destroços

..:::..

alguma coisa
aqui dentro
me consome

mas depois
que passsa
o tempo
some

..::..

segunda-feira, 9 de julho de 2007

rabo do gato

Ele todo era como o rabo do gato: cada parte de seu corpo tinha vida própria. Enquanto falava com uma velocidade absurda, atropelando palavras e até frases inteiras na correria da boca para tentar acompanhar os pensamentos, seus olhos existiam em câmera lenta. A boca dançava um tango alucinado, e os olhos, uma valsa das antigas. Piscava como quem está prestes a dormir, em câmera lenta, mesmo durante as maratonas verbais. Seus gestos dificilmente acompanhavam a verborragia, enquanto seus pés se moviam insistentemente, ainda que continuasse parado. Era uma contradição em si, membro a membro, cada sentido em uma sintonia, todo descompensado. Mas tinha ótimo coração.

domingo, 8 de julho de 2007

Liberdade

Liberdade mesmo é escrever.
Contar as histórias que quiser sobre as pessoas que inventar.
Insatisfeito com sua vida?
Pegue um papel e uma caneta e crie uma novinha em folha.
Supere seus medos, recrie suas falas, multiplique suas vitórias, dê voltas ao mundo, seja uma diva, um popstar.
Toda vida é uma obra de ficção.
Toda literatura tem - pelo menos - um quê de não-ficção.
Escrever é exorcizar fantasmas.
Os fantasmas do que foi, do que não-foi, do que poderia-ter-sido e do que se-Deus-quiser-será.
Eu, por exemplo, escrevo sobre o amor que queria sentir, o amor no qual queria acreditar;
sobre as decepções e mágoas que validariam meu amor, o sofrimento romântico de quem ama...
Escrever é a liberdade dos frustrados.

(26/11/2005)

sábado, 7 de julho de 2007

Déficit


Ele me ama,
mais que a tudo no mundo,
mais do que para sempre,
mais do que infinitamente,
não vive se mim!

Ele me ama
e nunca vai deixar de amar.
Quer casar, ter filhos, netos, bisnetos,
e fazer bodas de diamante.
Já planejou a casa, o cachorro, o papagaio
e até a secretária que vai virar amante...

Ele me ama e já pensou em tudo:
todas as brigas e perdões,
as cores e os sons,
viagens e traições...
já também fez a mala,
pra se mudar até com a cuia,
pra nossa vida-quarto-e-sala!

Ele me ama, completamente,
até com a mente,
e jura que não mente,
só diz o que sente!
É um amor descabido,
que não cabe nem em si,
nem no tempo,

nem no sentido,
nem em todos os longos dez minutos
em que nos conhecemos!

Ele me ama!
profundamente,
intensamente
e sem medida!
Nascemos um pro outro,
sou a sua prometida.
Ele já projetou toda a nossa vida,
e sequer perguntou meu nome!

É nisso que dá,
um amor com DDA...