terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Encontro

Uma história em três atos


Consta nos astros, nos signos, nos búzios
Eu li num anúncio, eu vi no espelho, tá lá no evangelho, garantem os orixás
Serás o meu amor, serás a minha paz
Consta nos autos, nas bulas, nos dogmas
Eu fiz uma tese, eu li num tratado, está computado nos dados oficiais
Serás o meu amor, serás a minha paz (…)”

Ato 1

- Que horas são?
- Já são sete e trinta e dois. Maldito!
- Desculpa!
- Não, não é com você…
- Ele tá atrasado?
- Como você sabe que é Ele?
- Quem mais poderia ser?
- Verdade… E está. Marcou comigo às sete em ponto. Estou aqui desde dez para as sete e nada do infeliz.
- Namorado?
- Não sei. Costumava ser, mas temos brigado e nos desencontrado tanto, que marcamos pra conversar. Hoje, trinta e dois minutos atrás. Estou criando raízes aqui e nada dele. Eu mereço. É vingança, tenho certeza… Não devia tê-lo feito me esperar tantas vezes. Aqui se faz, aqui se paga.
- É o que dizem.
- Não sei se continuo esperando ou se aceito logo que levei um bolo e vou-me embora.
- Espere um pouco mais, faça-me companhia.
- Ela está atrasada?
- Como você sabe que é Ela?
- E quem mais haveria de ser?
- É, você tem razão. Eu sou a sua versão masculina.
- Marcaram que horas?
- Sete e dez. Eu cheguei atrasado. Saí de casa às sete e dez.
- Ela é pontual?
- Costuma ser.
- Namorada?
- Não exatamente. Pelo menos não por enquanto, não com o rótulo.
- Entendo... Você sempre se atrasa?
- Normalmente. Eu sempre acho que dá tempo de chegar em qualquer lugar em dois minutos. Nunca conto o tempo que demora pra pegar o carro, estacionar, chegar ao lugar marcado… Se bem que hoje eu nem me atrasei muito. Dez minutos não é praticamente nada.
- É um tempo razoável. Ele sempre se atrasa também. Mas nunca mais de dez minutos, é a primeira vez. Só porque eu cheguei antes! Vai ver Ela previu seu atraso e resolveu se atrasar mais quinze minutos, pra fazer um charme.
- Ela não é tão esperta assim.
- Coitada da sua futura namorada. Você não é nada romântico.
- Romântico eu até sou, mas realista, acima de tudo.
- Ela deve estar com Ele.
- E Murphy. Todos juntos. Isso sim é romântico. Vocês namoram há muito tempo?
- Bastante. Seis meses, mais ou menos. E em seis meses ele nunca se atrasou mais de dez minutos. Só hoje, e só porque eu cheguei cedo. Ninguém merece.
- É pra você aprender a nunca chegar na hora, muito menos antes.
- Lição aprendida. Se bem que você chegou atrasado e não adiantou nada.
- Eu tenho que aprender a chegar na hora. Ela já deve ter vindo aqui. Não me encontrou, não quis esperar e foi-se embora.
- Será? Nada charmosa.
- Nem esperta, como eu disse.
- Sete e quarenta e três. Acho que eu já esperei demais.
- Você já tentou ligar pra Ele?
- Tentei. Fora da área de cobertura ou desligado. Como sempre. Não sei pra quê Ele tem um telefone.
- Pra dar “fora da área de cobertura ou desligado”. É um charme.
- Seu conceito de charme é meio esquisito.
- Todos os meus conceitos são meio esquisitos. Assim como eu.
- Você não me parece esquisito.
- Você é que me conhece pouco.
- Fato. Dez minutos não é tempo suficiente pra se conhecer alguém.
- Só é tempo suficiente para se atrasar.
- E pra esperar. Devia existir um estatuto do atraso e da espera. Tempo máximo pra alguém se atrasar: quinze minutos. Tempo máximo pra se esperar por alguém: vinte. O mundo seria um lugar mais tranqüilo.
- E teria menos gente na rua.
- Com certeza. Você já tentou ligar pra Ela?
- Eu nunca ligo pra Ela. Esse é o meu charme. Ela é quem me liga.
- Então Ela deve estar se vingando, fazendo você esperar tempo o suficiente pra cansar e ligar.
- Não vai funcionar. Eu não tenho o telefone dela.
- Você não tem o telefone da sua futura namorada em potencial?
- Pra quê se eu não ligo?
- Exatamente para eventualidades como essa. Se existe a possibilidade de vocês namorarem, acho que você devia pelo menos ter o número. Ainda que seja para não ligar.
- Tudo bem, você venceu. Assim que eu a encontrar, anoto o telefone.
- Muito bem. Dê mais valor a Ela. O meu namorado, por exemplo, teria maiores chances de continuar sendo meu namorado se telefonasse pra dizer que ia se atrasar.
- Você está mesmo pensando em terminar?
- Cada vez mais sério. Eu ouço mais a gravação de “fora da área de cobertura ou desligado” do que a voz dele desde que começou a faculdade. Maldita faculdade.
- Ele faz o que?
- Medicina. Quer salvar o mundo. E me deixar esperando.
- Ele deve estar treinando. Todo médico faz questão de nos deixar esperando, nunca atendem na hora marcada.
- Ótimo. Agora virei paciente estagiária do meu futuro ex-namorado. E a sua futura namorada está aprendendo com Ele.
- Ela não é tão esperta pra fazer medicina. Nem faculdade faz.
- Você fala dela como se ela fosse uma besta quadrada.
- Não é quadrada. Pelo menos por enquanto. Mas há uma grande chance de se tornar redonda daqui a uns vinte anos.
- Nossa, que amor!
- Pra você ver, Ela é pouco brilhante, mas mesmo assim eu gosto.
- Enfim romântico.
- Viu?! Estou aprendendo. Vou até anotar o telefone dela!
- Parabéns! Quem sabe um dia você liga, né?
- É, quem sabe!
- Sete e cinqüenta e três. Ainda bem que encontrei você. O tempo está passando mais rápido.
- O tempo é uma criatura interessante. Um minuto sempre tem mais de sessenta segundos quando você não está fazendo nada.
- E menos quando você está.
- De qualquer forma, quase quarenta minutos é demais para um atraso, né? Mesmo que eu só esteja aqui há vinte e cinco, e que os últimos vinte e poucos tenham voado.
- Verdade. Acho que já podemos ir embora sem sentir culpa por não termos esperado.
- Seria um desperdício.
- Ir embora?
- Esperar tanto tempo para nada.
- Quer tomar um café então?
- Falou a palavra mágica!
- Ótimo, estou morrendo por um café.
- Alex, muito prazer.
- Marcela.

Os dois vão tomar um café. Ela liga para o Alex e conta que a mãe começou a passar mal e por isso não pôde ir. Pede que ele vá até sua casa para se verem. Marcela liga de novo para Ele e consegue completar a ligação. Ele diz que está esperando há dez minutos e ela não aparece. Marcela descobre que tinham marcado às oito, não às sete. Marcela e Alex se despedem. Marcela vai ao encontro dele e Alex para a casa dela.

- Foi muito bom esperar e tomar um café com você.
- Igualmente. Quando decidir confundir o horário e ficar uma hora esperando à toa, pode me chamar.
- Eu já tenho uma qualidade para ser sua futura namorada em potencial, tá vendo?! Também não sou muito brilhante…
- Você tem outras qualidades para ser minha futura namorada em potencial. Falta de brilhantismo não é uma delas.
- Bom saber. Ainda tenho potencial.
- Quando lhe vejo de novo?
- Que tal daqui a um mês, no mesmo lugar em que nos conhecemos. Às sete e meia?
- Sem atrasos?
- Com quinze minutos de tolerância, nem mais nem menos.
- Você vai me dar seu telefone pro caso de eu me atrasar mais?
- Pra quê, você não vai ligar. É seu charme.
- Verdade. Então nos vemos mês que vem.
- Até lá. Bom começo de namoro pra você.
- E bom término pra você.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Goiabeira


Da janela da sala vejo uma goiabeira. Não entendo nada de árvores e seu relacionamento com as estações, mas mesmo à distância do meu astigmatismo, aquelas parecem jovens goiabas. É uma árvore alta, de tronco meio camuflado, cheia de folhas verdes – as mesmas folhas que na época marrom do ano se amontoam em minha varanda. Há quanto tempo será que esta árvore está ali? Qual será sua história? A goiabeira é vizinha do que deve ser um pé de abacate. E de outra árvore que me parece uma mangueira. Mais além há um coqueiro e muitas outras árvores que não imagino quais sejam seus frutos, mas que, pela altura dos galhos, sei que já presenciaram muitos anos de acontecimentos desta cidade. Provavelmente todas elas já estavam aqui quando este prédio foi construído. Devem ter alimentado os operários enquanto misturavam o cimento e empilhavam os tijolos. Mais tarde, serviram seus frutos aos primeiros moradores, possivelmente na época em que ainda havia bondes em Niterói e a ponte não era nem um sonho. E continuaram ali por todos os anos, despedindo-se das pessoas que iam embora saudosas e recebendo as que chegavam cheias de esperança. Quando eu me mudei pra cá, há quase dois anos, também era época de goiabas. Lembro de pensar em amarrar uma latinha na ponta de um cabo de vassoura para colher as frutas, coisa que até hoje não fiz. De repente corre um vento e… plaft! Uma goiaba cai sobre o teto da casa vizinha. Plaft!, outra. Quanto o mundo já mudou desde que essas árvores foram plantadas? Sei que, desde que eu me mudei pra cá, muito já mudou. No mundo e em mim. E nenhuma dessas árvores precisou fazer nada para que isso acontecesse… O tempo vai passando, invisível, como o vento, mudando tudo ao redor tão sutilmente, que é preciso que se passem anos até que percebamos. Tudo muda. Eu, por exemplo, estou me mudando, mês que vem. Vou abandonar esta goiabeira sem nunca ter provado um de seus frutos, deixando-a como testemunha dos frutos metafóricos que eu plantei por aqui. Não sei se eu fiz alguma diferença na vida desta árvore, mas sei que ela, mesmo imóvel, calada e além da grade, fez alguma diferença na minha.
E ainda há quem se recuse a ser revolucionário dizendo que nada adianta, que o mundo nunca vai mudar… Enxergar é preciso!

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(Esse é antigo, mais exatamente de 22/03/2006, quando eu estava terminando a 1ª faculdade, saindo de Niterói e voltando pro Rio. Mas acho que nunca tinha publicado. Então, voilà - Só enquanto não ajeito o antigo que pretendo republicar e que ainda não tem fim)

sábado, 19 de fevereiro de 2011

*desliga você primeiro*

- Eu te amo

- Eu te amo mais

- Mentira

- Você não acredita que eu te amo.

- Acredito, mas eu é que te amo mais

- Claro que não. Eu é que te amo muito mais

- Como é que você sabe?

- Simples, é impossível que você me ame mais do que eu te amo. Amor maior não há.

- Impossível é que eu seja mais brega do que você... Fora isso, é claro que eu amo mais, você não tem como saber

- Mas eu sei

- Sabe como?

- Eu sei, oras, e isso basta.

- “E isso basta”, aff, que tipo de argumento mais vazio é esse?! Aliás, isso nem é um argumento: é um não-argumento. E dos ruins.

- Desculpa, eu não sabia que tinha que redigir uma petição, um ofício e um memorando explicando que eu te amo e chamar perícia pra mensurar o quanto amo.

- Deixa de ser bobo! Eu só estou dizendo que não tem como você saber se me ama mais do que eu te amo.

- Então como é que você pode dizer que me ama mais?

- Porque é evidente que amo.

- Evidente? Evidente como?

- Ah, eu sou mulher, mulheres sabem dessas coisas.

- Não vale atribuir ao gênero! Quer dizer que eu sou geneticamente incapacitado de amar mais? Isso é absurdo!

- Não é absurdo! Mulheres são notoriamente conhecidas por serem mais sensíveis e sentimentais. Daí, eu amo mais.

- Não, você deve estar se confundindo: mulheres são notoriamente conhecidas por serem menos razoáveis. Daí, você é louca. E eu amo mais.

- Ei, eu sou razoável!

- Então você me ama mais ou menos. Porque uma pessoa razoável, não é oito nem oitenta, é o meio-termo.

- Aff! Eu odeio quando você vem todo cheio de lógica pra cima de mim!

- Você quem pediu, eu estava simplesmente dizendo que eu sei que amo mais e isso basta. Você que não aceitou.

- Então tá, me diz, por que você me ama?

- Por que eu te amo? Porque sim, ora!

- “Porque sim, ora!”, você está cheio de não-argumentos hoje!

- Ai, lá vamos nós de novo pra petição, o ofício e o memorando… Eu te amo porque… porque… ah, já sei! Porque você é luz, é raio, estrela e luar…

- Aff! Meu iaiá meu ioiô, mesmo, a essa hora?

- Por que? Tem hora própria pra isso?

- Não, aparentemente qualquer hora é hora de ser brega…

- Que mania de me chamar de brega!

- Não é mania, é apenas a constatação de um fato.

- Tá bom, mas eu sou o seu brega.

- Ownnn... Agora para de fugir do assunto. Por que você me ama?

- Hmmmm... Sabe aquele poema do Camões? O mais conhecido, que diz que o amor é fogo que arde sem se ver, ferida que dói e não se sente, é um contentamento descontente, é dor que desatina sem doer… Então, é assim que eu sinto por você e só por você.

- Ah, que lindo! Citando Camões! Se eu já te amava mais antes…

- Que cisma!

- O que posso fazer? Você só me faz te amar mais e mais...

- Já sei, então! Não te chamo mais de meu amor, minha vida. Você é minha privada entupida!

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Onde houver angústia... as asas



Ti,

Eu não gosto de chorar.
Nunca gostei, desde pequena, criança mesmo, já não era de fazer espetáculos de mim mesma. Muito menos espetáculos assim, deprimentes. Não sei bem porque, não que eu ache que chorar é uma fraqueza, acho que é porque eu não sei lidar com gente chorando, mesmo que seja eu. Minhas habilidades sócio-pessoais não são das melhores, nunca foram.

Eu não gosto de chorar, especialmente em público.
Mas às vezes não dá pra evitar. Outro dia fui ao banco, tentar pagar o carro, atrasado, mas não deixaram, porque o carro tá no meu nome e o cheque era do meu pai. Mas, oras, o carro é pago desde 2008, nunca com cheque meu, várias vezes atrasado. E em novembro eu paguei atrasado, no mesmo banco, mas em outra agência, com cheque do meu pai, e ninguém reclamou!… Enquanto eu tentava, em vão, explicar tudo isso pra gerente do banco, foi surgindo um nó na garganta e lágrimas começaram a empoçar os olhos. Subconsciente safado, porque, inclusive, a última coisa que minha mãe fez, fora de casa, antes de ter um treco e ser internada, foi ir exatamente aquele banco, àquela agência, pagar aquele carro, atrasado, com um cheque que não era meu. Na verdade, nem sei como ela pagou, só sei como não pagou: não com o meu cheque, porque depois disso, nos dias que sobraram, este assunto não era importante. Simplesmente não era importante. Mas a gerente do banco não tinha toda essa perspectiva. Pra ela, eu era uma maluca, chorando e tentando, com a voz embargada, explicar alguma coisa sobre como eles deveriam me deixar pagar uma conta, especialmente porque eles deviam estar mais interessados em receber do que eu em pagar. No fim das contas, eu desisti e saí do banco, porque chorar num banco é esquisito demais até pra mim, mesmo sabendo que tinha uma razão por trás daquilo.

Minha mãe morreu em um dia cinza.
Não é a memória afetiva falando, era um dia cinza mesmo, nublado, mas em que não choveu. Pelo menos não meteorologicamente falando. Eu ainda não tinha escrito sobre esse dia, o que quer dizer que não tinha parado pra pensar muito, talvez por evitação mesmo (que é uma palavra feia, mas existe de verdade)... E também quer dizer que, quando escrevi a primeira frase desse parágrafo, as lágrimas voltaram, intrometidas, sem convite. Agora, tentando lembrar, a memória é embaçada, e isso não é culpa das lágrimas, não das de agora.
O dia passou como um borrão, a notícia chegou umas 6h da manhã, me acordando, de um sono meio induzido por um tranquilizantezinho. Santo tranquilizantezinho, aliás. Eu posso ter parecido maluca, mas era uma maluca funcional. O que também pode não ser mérito do calmante, mas do estado de choque. Eu fui ao banco, à farmácia, ao hospital, dirigindo, ao posto de gasolina, fiz comida, fiz café, tive uma crise de choro na hora de escolher uma roupa pra ela, reclamei dos mosquitos, da lerdeza do carro fúnebre, ri no meio do enterro do caixão que quase caiu, chorei inconsolável em meio a vários abraços, feliz por ter amigos, não consegui evitar piadas fora de hora, vi um filme, aliás, muito engraçado, quase não dormi. Eu sei que essas coisas aconteceram, não nessa ordem, mas do que melhor me lembro é de que era um dia cinza. Cinza de nublado, cinza de tristeza e de pesar, cinza de preocupação, cinza do vazio que ficou.

Eu nunca tinha ido a um enterro antes, sou mesmo socialmente inábil, e certamente nunca poderia imaginar que o da minha mãe seria o primeiro. Minha mãe era provavelmente a pessoa que mais me amava no mundo. Certamente, dentre as pessoas que ela amava, era eu a mais amada. Vai ver foi por isso que não queria ter irmãos, porque sou ciumenta e gosto de ser a mais amada. Eu sempre soube disso, que era a mais amada, mesmo quando ela parecia não amar tanto assim, quando me irritava, sim, ela era bem irritante e não virou santa porque morreu. Minha mãe era implicante, intrometida, fofoqueira, barulhenta, superprotetora, chata e irônica. Mas era também a mais engraçada, sem-noção, maluca e simpática. Pelo menos 90% de quem a conhecia, gostava. Ela era meu azeite social, porque conhecia todo mundo, sabia de tudo. Ela quase sempre aparentava bom humor e enchia qualquer lugar com sua risada exagerada. Ela adorava me fazer passar vergonha, sempre ria e me chamava de boba e de antipática. E a gente discutia todo dia, por qualquer bobagem, mas nunca brigava de verdade-verdadeira, à vera. Ela era grande parte da minha vida, a maior, porque tomava conta de tudo, queria saber de tudo, e eu me senti tão sozinha, tão fragmentada quando ela morreu… como uma criança abandonada no mundo pela mãe.
Mas eu já sou burra-velha, eu sei.

Hoje eu fui ao segundo enterro da minha vida, em menos de três meses. A avó da minha melhor-amiga-desde-que-nasci morreu. Era um pouco minha vó também, e foi enterrada no mesmo cemitério que minha mãe. Mas eu não levei flores nem nada, mamãe não era muito chegada a flores, dizia que tinham *cheiro de defunto*. E eu nem sei qual é o jazigo ao certo, sequer faço questão de saber, porque não é ali que ela está. Onde quer que seja, não é ali. Passei o resto do dia meio chorosa, nem fui trabalhar, mas também não fui dormir, vim escrever.

Isso tudo é pra dizer que, quando eu mais me senti sozinha, muito mesmo, de verdade, você sem nem saber, me abraçou e disse “Estamos juntos”.
E quando eu fui fragmentos, você me levou pra casa e me colou.
E, não bastasse o tanto que eu já te amava antes, agora amo ainda mais, porque você é meu melhor-amigo-desde-antes-até-o-infinito-e-além, que me traz sorrisos involuntários, que me inspira e me faz escrever, que me faz acreditar em mágica e esquecer que eu não posso voar.
E porque eu gosto mais de mim com você por perto, já que, na verdade, eu gosto mais é de você.
E porque você é a coisa mais importante que aconteceu comigo hoje e em cada dia dos últimos mais de dez anos, mesmo quando me irrita, pessoa mais implicante que você é.
E também é pra agradecer por ter você na minha vida, porque eu não sei agradecer direito, então, além de prece pra Deus, Buda, Zeus, Alá, Krishna, Jeová, Super-Homem e quem mais quiser me escutar, vim agradecer a você, que entrou na minha vida…
 e resolveu ficar.

Eu não gosto de chorar.
Nunca gostei . Às vezes eu pareço fria, insensível, como se não ligasse pra nada, indiferente. Mas não é isso. É que não sou dada a demonstrações explícitas de sentimentos.
Desde pequena, criança mesmo, já não era de fazer espetáculos de mim mesma.

Mas eu te amo, muito, mesmo, viu?

Lu.

(08-02-2011)