Anda pela ruas como quem procura algo...
Mas o quê?
dinheiro, sexo, um amigo, uma xícara de café?
É noite, mais uma noite, depois de mais um dia
em que nada extraordinário aconteceu.
Mas talvez não reconhecesse o extraordinário se aparecesse em sua frente com um letreiro de neon na cabeça e lhe desse um sonoro tapa na cara.
Esta noite faz frio.
Mesmo o casaco, as luvas, as meias, o cachecol,
nada é suficiente para aquecer.
Talvez nem faça tanto frio assim, não sabe,
por dentro, sente nevar . . . .
. . . . . .
. . . . .
. . never . . .
. . . .
. . . .
.
aquele Adeus foi de quem nunca mais vai voltar, pode ouvir se repetindo em sua cabeça,
e é isso, talvez nunca mais volte mesmo, embora não tenha dito nada nesse sentido, mas é assim que o fez sentir, foi assim que fez nevar.
“Tenho que ir”, ele disse.
Uma luz se apagou dentro dela, que fechou os olhos e suspirou, como se derrotada, “Adeus”.
Talvez deva parar de andar, de procurar, e voltar. O que está procurando mesmo?
Lembra da história do avozinho que procurava os óculos que estavam o tempo todo na ponta do nariz, versinho do Quintana, ah, o Quintana dela!
E então se enche de saudades, saudades futuras, na verdade, e se aquilo foi mesmo um Adeus, assim, com letra maiúscula? Adeus de nunca mais, nunca, never, neve.
O sangue congela com esse último pensamento e para de andar. Não pode ser. Nunca? Nunquinha? É tempo demais, um disparate, um desperdício.
Não sabe o que fez pra merecer aquele Adeus, mas tem que desfazer, tem que se desculpar, do que quer que tenha sido, de qualquer coisa, sei lá!
Então corre, corre como não corria desde criança, corre voltando, em desespero.
A noite já virou madrugada, quase ninguém na rua, então pode correr com todo desalinho, despreparo, destempero.
O corpo se aquece, está quase chegando, falta pouco, respira, o ar foge, para um pouco, inspira, expira, inspira, expira, e quando chegar, o que vai dizer? E se for tarde demais? Não pode ser! inspira, volta a correr, pensa que devia parar de fumar, expira, corre mais rápido, começa a chover.
Mas, espera!, o chão não está molhado, nem o cabelo, nem as roupas, só os olhos. Ótimo, não bastassem os músculos doendo, a falta de ar, agora chove e mal consegue enxergar o caminho a sua frente!
De repente, a visão turva pelas lágrimas, quer dizer, chuva, não bem o impede de enxergar, não, repara bem, é o contrário: de onde vieram a chuva, a neve, o desespero? É óbvio! Como não viu antes?
Inspira, expira, suspira. Que alívio! Chegou, não é tarde demais, toca a campainha, espera, ouve passos se aproximando, ela abre a porta, os olhos vermelhos, esteve chorando, mas por quê? O que aconteceu? O que ele fez? Não pode ser Adeus! Não se passaram dois segundos desde que abriu a porta, ela franze a testa, como quem pergunta o que ele está fazendo ali, de repente, àquela hora. E ele não fala nada, não sabe o que dizer, teve uma epifania e resolveu voltar, nunca mais quer ouvir adeus, não sabe explicar, mas é isso, é o extraordinário com um letreiro de neon na cabeça lhe dando um tapa na cara. É isso, o que procurava a vida toda. Ela sorri timidamente, ele sente a neve derreter, o peito se aquece, parece até que as estrelas brilham mais e as cores se avivam, mas isso certamente é sua imaginação.
Aquele Adeus, não foi bem o que ele fez, foi mais o que deixou de fazer.
“Você não tinha que ir?”, ela pergunta, com uma ponta de desconfiança e outra de esperança.
Ele, que finalmente recuperou o fôlego, sorri. “Achei meus óculos”.
Da Felicidade
Quantas vezes a gente, em busca da ventura,
Procede tal e qual o avozinho infeliz:
Em vão, por toda parte, os óculos procura,
Tendo-os na ponta do nariz!
(Mario Quintana)
2 comentários:
:D
estou apaixonado.
tem algo de gelado no adeus...
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