sábado, 28 de julho de 2007

Insônia

Mais uma noite
não sei se vou agüentar
Estou cansada,
não tenho sono,
o tempo custa a passar

Faz muito frio
deito com sua ausência,
abraço o travesseiro,
vejo você,
em meio ao silêncio,

meu pulsar frenético
se confunde com uma canção de ninar
sussurrada por sua voz monocórdica
que me embala os sentidos

a distância transforma o passado
em reticências...
mas a vontade o aviva
com cores de Andy Wahrol
vontade de rever
reviver
voltar
revirar
revoltar

a saudade me aquece
no que a memória falha,
o corpo não esquece
velejando entre sonho e lembrança,
sinto sua barba macia,
suas mãos lenientes,
seu cheiro de sabonete barato

você está em seu lugar,
ao meu lado, a minha volta,
envolto
em meus braços

Sem aviso, as luzes da manhã
invadem o quarto
me despertam de um estado hipnótico
e roubam você de mim
tento ignorar,
me concentro,
não quero que você vá
(ainda não...)
só mais um pouco...

mas a luz é mais forte
que a minha escuridão

Mais uma vez o tempo me ultrapassa
me ultraja
e vence

olho ao redor,
procuro por você
não há ninguém além do silêncio

(agora tenho que enfrentar mais um dia,
e mais uma noite,
e não sei se vou agüentar...)

quarta-feira, 25 de julho de 2007

sôdade

Parece que foi há
semanas,
séculos,
milênios...

E foi.

Foi todo esse tempo
e mais um pouco,
todo esse tempo
e um pouco mais.

Todo o tempo do mundo
nunca é suficiente.
e "nunca",
nem é tanto tempo assim.

Não é exagero
É saudade.

segunda-feira, 23 de julho de 2007

quem tem fome tem pressa

tenho fome de tudo
e tenho pressa
quero tudo pra ontem
e do meu jeito

se o que eu busco
não existe
não desisto
eu invento

com unhas e dentes
eu devoro
sem decoro
indecente

sábado, 21 de julho de 2007

chuva


“O coração é um músculo muito elástico”
Woody Allen,
em Hannah e Suas Irmãs

Começou um temporal enquanto voltava para casa.

Lembrei-me outro como este, quando você me deixou
e eu saí andando sem rumo madrugada adentro,
desejando que aquela água lavasse a alma
e levasse embora as lágrimas.
Só mesmo o barulho da chuva chicoteando o chão
pra abafar gritos de tristeza, raiva e incompreensão.
Cheguei a desejar uma pneumonia arrebatadora,
para culpá-lo ou pelo menos justificar tanta tristeza
(talvez a dor física pudesse superar as dores do coração).

Há tempos não pensava em você
(que fez temporal em minha vida)...

Cheguei em casa encharcada
lembrado de outro tempo,
quando te acompanhei a um lugar estranho,
cercada por gente estranha,
apenas seguindo o teu sorriso.
Sozinha
perdida
iludida.


Hoje,
o som da chuva no telhado a fazia parecer mais forte do que era
(o diabo nunca é tão ruim quanto o pintam).
Já quase seca, um impulso leva-me de volta à chuva,
na varanda
As gotas tocam meu rosto,
como o céu devondo as lágrimas derramadas;
uma remição tardia.
De repente, um sorriso,
que vira risada
e explode em gargalhada.

Quem está na chuva é para se molhar.
Mas depois a gente se seca.
Eu me sequei.

sexta-feira, 20 de julho de 2007

Head Over Feet

Não se espante se eu me apaixonar por você
Eu sou assim: me apego fácil
E me encanto, e me iludo, e me apaixono...

Não se espante se for logo por você
e seus cabelos despenteados,
e seus tênis remendados,
e suas desculpas esfarrapadas...

Acontece que, entre trancos e barrancos
e remendos e farrapos...
eu me encontro
e me encanto...

Mas não se espante,
ouvi dizer que é assim mesmo:
O amor despenteia
(como em propaganda de shampoo)

quinta-feira, 19 de julho de 2007

É

É, só pode ser amor, acho que você tem razão. Fico mais feliz ao seu lado. Sou mais eu quando estou com você. Já em sua ausência, sou toda você. Tá certo, você já sabia: só podia ser amor. Mas como foi que eu cheguei à conclusão sozinha? Logo eu que não acreditava em amor? Foi difícil, eu lhe garanto. O processo de aceitação mais lento e gradual pelo qual já passei. Começou com afeição, virou encantamento, seduziu-se com a cumplicidade, confundiu-se com amizade. No meio da fase da acomodação, espantou-se com vontade, necessidade, ciúmes e brutais saudades. Por fim veio à luz. Amor, só pode ser amor... Afeiçãozinha safada aquela, não? E agora, que nós dois sabemos disso, é melhor pararmos de perder tempo, não acha? Então, vamos correndo para o centro da Terra, onde o calor intenso vai conservar nossa chama?

quarta-feira, 18 de julho de 2007

ego

hoje estou cansada
quero 24h de férias
e quero você pra mim,
só para mim
em cada segundo,
quero ser primeira

portanto, desligue o celular,
o orkut, o msn, o canal telepático
tranque o mundo la fora, isole-o
não quero saber de jornal, tv, política,
futebol, religião, economia, vida alheia...
nada que não diga respeito a mim
nada disso interessa

quero atenção exclusiva,
silêncio, carinho, compreensão
quero ser a única no mundo,
no nosso

egocêntrica, egoísta (e ciumenta)
megalomaníaca com poucos recursos
embarque na minha egotrip
só por hoje, fique tranquilo
amanhã tudo volta ao anormal

terça-feira, 17 de julho de 2007

reerrar

"give me reason, but don't give me choice
cause I will just make the same mistakes again"
(James Blunt)

Parece que tudo o que passou
ainda nem aconteceu
Minha vida roda ao contrário
Giro em torno do meu próprio mundo,
à deriva no universo...

Eu sou o que vem antes do passado,
a memória de um peixe.
Vivo de recomeços,
sempre há um novo erro a se cometer.

E os nossos inícios são sempre inéditos
- novos erros, eu diria -
novos inícios pro que nunca teve fim.



(dez. 2005)

segunda-feira, 16 de julho de 2007

Soraya

(Para o Bruno)

A primeira vez que parei o mundo foi quando conheci Soraya.

Estava em um congresso, e até então só tinha visto uma foto dela. Foi um amigo em comum que me mostrou a foto, e prometeu que éramos feitos um para o outro. Eu, que estava soltinho e já em liquidação total, acreditei e me apaixonei quase que instantaneamente. Contei os dias até o congresso, quando finalmente conheceria Soraya. Sabia que ela estaria lá, pois ela participava da organização, mas o amigo não pôde ir para nos apresentar. Cansado de esperar por uma intervenção divina, decidi dar uma mãozinha ao destino. Passei horas vasculhando os rostos de todas as moças presentes em busca da figura que vira na foto. Nada. Inconformado, decidi recorrer à mesa de informações. Fui até uma moça com uma prancheta na mão e perguntei por Soraya Campos. A moça, muito solícita, apontou-a para mim. É aquela ali, ó!. Aquela onde? Aquela, bem na frente. Olhei, olhei e não acreditei. Ali, ó, não tá vendo? Aquela de blusa branca e saia jeans.

Foi nesse momento que o mundo parou. Parou por alguns minutos, horas, dias, não sei dizer. O mundo parou no exato tempo de duração da frase "Aquela, de blusa branca e saia jeans". Pode parecer coisa pouca pra você, que não estava lá. Mas "aquela, de blusa branca e saia jeans", é uma frase emblemática na minha vida, que ecoou por todo o mundo durante o tempo em que ele parou. Repetiu-se inúmeras vezes, e eu a ouço até hoje. Em câmera lenta.

"A q u e l a , d e b l u s a b r a n c a e s a i a j e a n s . . ."

Eu tentei fechar os olhos, tapar os ouvidos, abrir um buraco no centro da Terra e me enfiar lá, mas antes que pudesse decidir o que fazer, o mundo voltou a girar.

Bem na minha frente, estavam umas vinte mulheres. Dezenove de preto. Uma de saia jeans e blusa branca. Duas eram lindas, cinco eram bonitinhas e outras doze eram normais. Uma estava de blusa branca e saia jeans.

Ainda a vejo em meus pesadelos.
Sempre de saia jeans e blusa branca.
Acho que aquele "amigo" não gostava muito de mim.

"Eu queria ter um lança-chamas
Eu queria ter uma fogueira
Eu queria ter somente um fósforo
Eu queria ter uma vela acessa
Pra queimar Soraia
Pra ver torrar seu couro
Pra deixar somente o osso exposto ao sol
E depois da meia-noite
Soraia vai voltar
Ela vem toda queimada
Se vingar, se vingar
Eu quero ver
Soraia Queimada
Soraia Queimada
Porque Soraia me queimou
Eu queria ácido sulfúrico
E um litro de alcóol tubarão
Eu queria uma tocha iluminada
Pra deixar Soraia igual carvão
E depois da meia-noite
Soraia vai voltar
Ela vem toda queimada
Se vingar, pode vir! ,se vingar.
Eu quero ver
Soraia Queimada
Soraia Queimada
Porque Soraia me queimou
E doeu..."

(Soraia Queimada, do Zeu Britto)

sexta-feira, 13 de julho de 2007

filosofia da mente para o coração

O que a gente sente devia ser o bastante
o que a gente sabe, sem explicação
Mas estamos sempre em busca de conceitos,
lógica, definições, porquês, razão
Pra quê tudo isso?

Sentir é mais difícil do que explicar
não se aprende em livros
Motivos são fáceis de inventar:
basta um pouco de imaginação,
bom senso e boa vontade

Sentidos
Sentir
sem sentido


Qualia
conhecimento em primeira mão
o inefável,
o indelével,
o inexplicável,
certeza na primeira pessoa

Eu gosto de você assim,
de graça
Não é porque você gosta do Chico,
do Almodóvar ou do Quintana
Nem porque sua cor favorita é lilás,
ou porque também quer ir pra Londres,
e fazer o sol nascer toda manhã

Não é pelo seu senso de humor
negro,
nem por sua alma
furta-cor
Nem por tudo que você diz saber,
nem pelo que não entende sobre
amor

Foi por tudo isso que eu fiquei,
mas nada disso me trouxe aqui.

Gosto desde antes,
talvez, de sempre.
Não preciso de A+B
Para provar o que sinto

Pode ser intuição,
pode ser instinto
(de sobrevivência ou destruição)
Tanto faz.

A rosa ainda seria uma rosa,
mesmo que se chamasse
Garibaldo.

Eu não seria mais eu
se não tivesse você
ao meu lado.

_____________________________

Qualia [singular: quale, em latim e português]. Termo filosófico que define as qualidades subjectivas das experiências mentais. Por exemplo, a vermelhidão do vermelho, ou o doloroso da dor. (tem mais aqui)

quinta-feira, 12 de julho de 2007

romantismo de uma cética

Rio de Janeiro, 3 de novembro de 2002.
Querido espelho (já explico),

Havia uma tormenta em minha mente, então decidi escrever para me aliviar um pouco das idéias que me perseguiam. Como você bem sabe, acredito que as idéias e os pensamentos só tomam forma e podem ser melhor analisados ao ganhar o mundo. Por isso, trago-lhe meus pensamentos, para que você me ajude a analisá-los e desvendá-los. Ninguém melhor do que você para ajudar-me nessa árdua tarefa…

Então… depois desse primeiro parágrafo explicando o porquê de tão inusitada carta, posso, enfim, ir ao assunto que nos trouxe aqui: eu pensava em você. Ou melhor, em mim. Ou, mais exatamente, no amor. Calma que tudo é justificável.

Antes de lhe conhecer, não acreditava no amor. E talvez ainda não acredite. Bem, certamente não acredito no amor da forma em que ele é exposto na mídia. Não acredito na impossibilidade de uma pessoa viver sem a outra. Mas acredito sim que uma pessoa não queira viver sem a outra. Esse é o meu caso. Pelo menos por enquanto (Não acredito no perpétuo, mas adoraria que você me provasse errada).

Drummond escreveu: “o que pode uma criatura senão, entre outras criaturas, amar?”. Agora começo a entendê-lo. E começo a entendê-lo não porque amo (pois nem sei se amo), mas porque fiquei pensando nos mecanismos dos quais o coração se utiliza para escolher a quem amar. Renato Russo cantou “Quem um dia irá dizer que existe razão nas coisas feitas pelo coração? E quem irá dizer que não existe razão?”. Com todo o respeito, não acredito na aleatoriedade do coração. Acho que, se gostamos, gostamos por um motivo, e se amamos, amamos por um motivo ainda melhor.

Prometo que esta será minha última citação, e, como não poderia deixar de ser, de um dos nossos poetas favoritos, Mário Quintana. “O amor é um beijo no espelho…”. Essa pequena frase norteou todo o meu pensamento. Escolhemos para amar àquele que mais se parece conosco: amamos quem tem em si o que gostamos em nós, ou o que gostaríamos de ter. Amar é enxergar-se no outro. Você é assim. É o que eu sou e o que eu gostaria de ser. É meu espelho.
Sei que havia prometido, mas outra (e agora sim última) citação se faz necessária… (nada como subverter minhas próprias regras) “Amar é admirar com o coração. Admirar é amar com o cérebro” (Theophile Gautier).

Perdoe-me se não pareço tão romântica, se a minha visão de amor é um tanto narcisista e egoísta, mas cada um é romântico a seu jeito. Eu sou ao meu. Talvez ao nosso.

Com amor e admiração,
LM

quarta-feira, 11 de julho de 2007

lembrança que brilha na mente eterna

sou cheia de incertezas absolutas
e de mistérios transparentes

acompanhada por uma ausência incômoda
presente no passado
e
imperfeita no futuro

presa em repetições da memória falha
esqueço das mágoas
e me surpreendo várias vezes com a mesma coisa
prevendo lembranças que brilhem
eternamente
e que nunca mintam

persisto, insisto
desisto

um dia a gente aprende

e eu acerto

terça-feira, 10 de julho de 2007

breves

..::..

Desperto
Disparo
De perto
Destroços

..:::..

alguma coisa
aqui dentro
me consome

mas depois
que passsa
o tempo
some

..::..

segunda-feira, 9 de julho de 2007

rabo do gato

Ele todo era como o rabo do gato: cada parte de seu corpo tinha vida própria. Enquanto falava com uma velocidade absurda, atropelando palavras e até frases inteiras na correria da boca para tentar acompanhar os pensamentos, seus olhos existiam em câmera lenta. A boca dançava um tango alucinado, e os olhos, uma valsa das antigas. Piscava como quem está prestes a dormir, em câmera lenta, mesmo durante as maratonas verbais. Seus gestos dificilmente acompanhavam a verborragia, enquanto seus pés se moviam insistentemente, ainda que continuasse parado. Era uma contradição em si, membro a membro, cada sentido em uma sintonia, todo descompensado. Mas tinha ótimo coração.

domingo, 8 de julho de 2007

Liberdade

Liberdade mesmo é escrever.
Contar as histórias que quiser sobre as pessoas que inventar.
Insatisfeito com sua vida?
Pegue um papel e uma caneta e crie uma novinha em folha.
Supere seus medos, recrie suas falas, multiplique suas vitórias, dê voltas ao mundo, seja uma diva, um popstar.
Toda vida é uma obra de ficção.
Toda literatura tem - pelo menos - um quê de não-ficção.
Escrever é exorcizar fantasmas.
Os fantasmas do que foi, do que não-foi, do que poderia-ter-sido e do que se-Deus-quiser-será.
Eu, por exemplo, escrevo sobre o amor que queria sentir, o amor no qual queria acreditar;
sobre as decepções e mágoas que validariam meu amor, o sofrimento romântico de quem ama...
Escrever é a liberdade dos frustrados.

(26/11/2005)

sábado, 7 de julho de 2007

Déficit


Ele me ama,
mais que a tudo no mundo,
mais do que para sempre,
mais do que infinitamente,
não vive se mim!

Ele me ama
e nunca vai deixar de amar.
Quer casar, ter filhos, netos, bisnetos,
e fazer bodas de diamante.
Já planejou a casa, o cachorro, o papagaio
e até a secretária que vai virar amante...

Ele me ama e já pensou em tudo:
todas as brigas e perdões,
as cores e os sons,
viagens e traições...
já também fez a mala,
pra se mudar até com a cuia,
pra nossa vida-quarto-e-sala!

Ele me ama, completamente,
até com a mente,
e jura que não mente,
só diz o que sente!
É um amor descabido,
que não cabe nem em si,
nem no tempo,

nem no sentido,
nem em todos os longos dez minutos
em que nos conhecemos!

Ele me ama!
profundamente,
intensamente
e sem medida!
Nascemos um pro outro,
sou a sua prometida.
Ele já projetou toda a nossa vida,
e sequer perguntou meu nome!

É nisso que dá,
um amor com DDA...